> Discos "perdidos"

   Pegou no CD comprado três anos antes, olhou para a capa e percebeu que esse disco que escutou várias vezes, durante esse tempo, nunca existiu. Essas notas que ouviu ficaram suspensas nesse espaço vazio que foi a sua vida. De repente a sua verdade era apenas um sonho, uma realidade aparentemente instruída, decididamente falsa. Acordou desse sonho e de repente deixou de existir. 
   Nessa noite perdeu a vontade de ouvir música. Agarrou nos discos que ouviu nos últimos anos e arrumou-os no fundo do baú, com eles arrumou também os livros e os sonhos que neles lera. Fechou nessa caixa o passado que nunca existiu: o seu.

> Olhar cheio de nada

   Olhei para dentro das pessoas, de uma meia dúzia que caminhava a meu lado na rua. Vi apenas algumas sombras de uma vida encarcerada, de uma insónia que condenou o sonho ao esquecimento. Passei por elas, por dentro delas, e senti um vazio: olhei e não as vi. Haviam-se perdido há muito: elas e as ilusões - as delas e também as minhas. Perdi-me eu... e elas também.